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Aumento no IPVA de locadoras de veículos pode gerar rombo de R$ 323 mi em MG

Projeto na ALMG que eleva alíquota para locadoras pode tirar emplacamentos de Minas. Estado e setor temem migração de empresas e queda na arrecadação de ICMS

Sob a justificativa de aumentar a arrecadação do Estado durante a pandemia, um projeto de lei em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) tenta igualar a alíquota do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) cobrado das locadoras de veículos, que hoje é de 1%, à cobrada das pessoas físicas, de 4%. Na perspectiva do mercado e do próprio governo de Minas Gerais, porém, a medida pode reduzir emplacamentos no Estado e gerar um efeito cascata de prejuízos, com um rombo anual de R$ 323 milhões do arrecadado com o imposto para os cofres públicos.

Nesta semana, o projeto, de autoria da deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia. Agora, ainda precisa passar pela Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária antes de ser votado pelos deputados, o que ainda não tem data para ocorrer. Por meio da Secretaria de Estado de Fazenda (SEF-MG), o próprio governo já se posicionou contrário ao projeto, que pode resultar no fechamento ou migração de empresas locadoras de veículos no Estado, na perspectiva do Executivo. Só em Minas, o setor gera quase 12 mil empregos diretos, distribuídos entre cerca de 1.400 empresas. 

“Apesar de propor aumento de alíquota, o PL 1.657/2020 pode, paradoxalmente, resultar em considerável perda de arrecadação de receita, caso seja aprovado. O mais provável é que, em função da mudança das regras atuais, as empresas locadoras de veículos que hoje atuam em Minas migrem os registros de suas frotas para Estados onde a alíquota de IPVA também é de 1%”, detalha a SEF-MG, por meio de nota. Atualmente, 67% dos veículos das locadoras são emplacados em Minas Gerais. 

Já a autora do projeto argumenta que aumentar os impostos sobre locadoras seria uma alternativa para equilibrar custos. “A diminuição da alíquota de IPVA para empresas de locação de automóveis configura-se como uma isenção que beneficia apenas empresas”, diz o texto.

O IPVA, porém, não é o único imposto sobre as locadoras que pesa na balança tributária do Estado, conforme lembra o presidente da Associação Brasileira de Locadoras de Automóveis (Abla), Paulo Miguel Junior. Com a eventual debandada de empresas, Minas também tenderia a sofrer perdas na arrecadação do ICMS, de acordo com representante do setor. 

“Não podemos esquecer que o IPVA está aliado à compra, ao licenciamento e ao primeiro emplacamento do veículo. O ICMS que isso gera para Minas não é desprezível, porque a alíquota para compra de veículos no Estado é de 12%. Se as locadoras migrarem as frotas para outros Estados, vão migrar a compra, e o ICMS será destinado a outros locais”, detalha.

A posição é reforçada pelo secretário de Estado de Fazenda, Gustavo Barbosa, que também prevê prejuízos com a possível migração de locadoras: “Somente em 2019, as locadoras adquiriram um total de R$ 2 bilhões em veículos zero-quilômetro, sendo a maior parte em Minas Gerais. Mais uma vez, sairiam prejudicados o Estado e os municípios mineiros”, diz.

Competitividade

A consolidação de Minas Gerais como polo de locadoras foi um processo gradual, de acordo com Paulo Miguel Junior. O estabelecimento da alíquota do IPVA em 1% foi aprovado em 2003, mas não é o único atrativo estadual, segundo ele.

“O Estado aperfeiçoou o seu Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran) e toda a tratativa de licenciamento de carros, o que o deixou mais atrativo do que os outros, por isso as locadoras operacionalizam as frotas em Minas. O IPVA não é o grande diferencial, hoje, mas a alteração dele desequilibraria a balança. Ela não agravaria ou deflagraria uma guerra fiscal, mas desestruturaria algo já estruturado e que Minas trabalhou anos para aperfeiçoar”, diz.

A Associação  Nacional de  Empresas  de  Aluguel  de  Veículose Gestão  de  Frotas (Anav) também se posicionou contrária ao projeto. “A adoção de alíquota específica para locadoras de veículos é amplamente adotada pelos Estados — 17, dos 24, têm carga reduzida para veículos destinados à locação”, pontua o presidente da entidade, Paulo Saab.

Entrevista: Bernardo Motta Moreira, professor de direito tributário do Ibmec

Na perspectiva do senhor, faz sentido igualar a alíquota do IPVA de locadoras ao de pessoas físicas neste momento? O Estado argumenta que isso poderia fazer as empresas migrarem.

Existe uma guerra fiscal entre os Estados, e foram outros, e não Minas, que a iniciaram. Outros Estados abaixaram a alíquota para 1%, e o que aconteceu foi que locadoras começaram a migrar de Minas, então o Estado teve que entrar na guerra para mantê-las aqui. Essa guerra não ocorreria se o Senado Federal fixasse uma alíquota mínima para o IPVA, igual para todos os Estados. A própria Constituição de 1988 prevê que isso seja feito e até hoje não foi.

O que a aprovação do projeto de lei poderia trazer de vantagens e desvantagens para o Estado?

Essa é uma questão que ainda vai ser maturada pelo poder Legislativo.  A discussão só começou e o projeto ainda vai para sanção ou vetos do governador e os próprio setores interessados se manifestarão. Para as pequenas empresas, o impacto vai ser maior. As grande emigram facilmente do Estado, mas não as pequenas. É difícil antecipar o que vai acontecer. Pode ser que se chegue a um meio-termo da cobrança, por exemplo. 

A pandemia é o momento adequado para a discussão sobre os tributos?

Sim, porque a pandemia deixou clara a necessidade da participação do Estado. Em face das demandas, ele tem que buscar recursos, então esse debate surge, naturalmente. Temos a oportunidade de discutir a isonomia do IPVA, por exemplo. No Brasil, não temos IPVA sobre aviões e embarcações, porque são grandes patrimônios. Também não temos alíquotas progressivas de IPVA como existe no Imposto de Renda, então a pessoa pode ter um carro de R$500 mil e pagará uma alíquota de 4% como a pessoa que tem um carro de R$20 mil. As locadoras têm uma alíquota vantajosa em relação ao cidadão. Mas isso não envolve só o 1% de IPVA. Elas também geram ICMS. A questão é uma sinuca, não é fácil. 

Por Gabriel Rodrigues

Fonte: O Tempo

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